Francisco Mosimann

18 de out. de 2025

Termo de Consentimento: Por que a especificidade é crucial para a segurança jurídica na área da saúde?

Francisco Mosimann

18 de out. de 2025

Termo de Consentimento: Por que a especificidade é crucial para a segurança jurídica na área da saúde?

O Termo de Consentimento Informado (TCI) é um documento de suma importância na relação entre profissionais de saúde e pacientes. Ele materializa o dever de informação e o respeito à autonomia do paciente, garantindo que a decisão por um tratamento ou procedimento seja tomada de forma livre e consciente. Contudo, a validade e a eficácia deste documento dependem diretamente de sua especificidade, um tema que tem ganhado cada vez mais destaque na jurisprudência brasileira, especialmente no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O Conceito de "Blanket Consent" e a Posição do STJ

Recentemente, o STJ tem se posicionado de forma contundente contra os chamados "termos de consentimento genéricos" ou, no termo em inglês, "blanket consent". Em decisão emblemática da Terceira Turma, ao julgar um caso de falha no dever de informação que resultou no falecimento de um paciente, o tribunal ressaltou que o consentimento não pode ser obtido por meio de "comentários imprecisos ou formulados em termos excessivamente técnicos" [1].

O STJ entende que o "blanket consent" não cumpre a sua finalidade, pois não informa o paciente de forma clara e precisa sobre os riscos, benefícios e alternativas do procedimento proposto. A decisão reforça que o dever de informação é um direito do paciente, decorrente não apenas do Código de Ética Médica, mas também do Código de Defesa do Consumidor, que em seus artigos 6º, III, e 14, assegura o direito à informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.

A Necessidade de Especificidade Conforme a Complexidade do Caso

A decisão do STJ e a doutrina moderna sobre o tema apontam para uma relação diretamente proporcional: quanto maior a complexidade e os riscos de um procedimento, maior deve ser o nível de detalhamento e especificidade do Termo de Consentimento. Não basta uma autorização genérica para a realização de um ato médico; é preciso que o paciente compreenda as particularidades do seu caso e os riscos a ele inerentes.

Isso significa que o TCI deve ser personalizado, levando em consideração as condições clínicas individuais do paciente, suas comorbidades e os riscos específicos associados ao procedimento em questão. A informação deve ser prestada em linguagem acessível, evitando-se jargões técnicos que possam dificultar a compreensão do leigo.

Exemplo Prático: Cirurgia Eletiva em Paciente Diabético

Para ilustrar a importância da especificidade, consideremos um exemplo amplamente aplicável a diversas especialidades médicas: um paciente diabético que será submetido a uma cirurgia eletiva. O diabetes mellitus é uma das comorbidades mais prevalentes na população brasileira e representa um fator de risco significativo para complicações cirúrgicas.

Um Termo de Consentimento genérico, que apenas mencione "existem riscos cirúrgicos inerentes ao procedimento", seria absolutamente insuficiente para um paciente diabético. O profissional de saúde tem o dever de fazer constar, de forma expressa e detalhada no TCI, as implicações específicas da condição do paciente.

O documento deve informar claramente que pacientes diabéticos apresentam maior risco de infecção no sítio cirúrgico devido à alteração da resposta imunológica. Deve esclarecer que a cicatrização pode ser mais lenta e complicada, em razão de sua condição. É fundamental informar que o controle glicêmico rigoroso no período peri-operatório é essencial para minimizar complicações, podendo exigir ajustes na medicação e monitorização mais frequente. Por fim, deve alertar sobre a possível necessidade de acompanhamento médico prolongado e mais intensivo no pós-operatório.

Essa abordagem não apenas cumpre o dever de informação, mas também confere maior segurança jurídica ao profissional, que demonstra ter agido com a devida diligência e transparência, alinhando as expectativas do paciente à realidade do seu caso concreto.

Conclusão

A jurisprudência do STJ e a crescente conscientização dos pacientes sobre seus direitos exigem uma nova postura dos profissionais de saúde. A elaboração de Termos de Consentimento Informado específicos, detalhados e personalizados não é apenas uma formalidade burocrática, mas um pilar fundamental para a construção de uma relação de confiança e para a garantia da segurança jurídica de todos os envolvidos.

O exemplo do paciente diabético ilustra perfeitamente como a especificidade do termo de consentimento protege tanto o paciente, que pode tomar uma decisão verdadeiramente informada, quanto o profissional, que demonstra ter cumprido integralmente seu dever de informação. Em um cenário de crescente judicialização da medicina, essa prática representa não apenas excelência técnica, mas também prudência jurídica essencial.


Referência

[1] Superior Tribunal de Justiça. (2022, 25 de abril). Para Terceira Turma, indenização por falha de informação ao paciente não pode ignorar realidade da época dos fatos. https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/25042022-Para-Terceira-Turma--indenizacao-por-falha-de-informacao-ao-paciente-nao-pode-ignorar-realidade-da-epoca-dos-fatos.aspx